INTERCOM 1994
ARTE E IMAGINÁRIO INFANTIL
PAULO ALEXANDRE CORDEIRO DE
VASCONCELOS
ABRINDO
A presente comunicação tem como
objetivo discutir a produção criadora da criança, suas implicações com o
imaginário infantil .e com as questões sócio- econômicas e culturais, entre
outras, que se mesclaram no decorrer do trabalho ligado à produção criadora
infanto-juvenil.
Afora as incursões teóricas, nos
remeteremos as nossas práticas ocorridas nos
programas de complementação escolar da
Secretaria do Menor -Governo de São Paulo 1988 a 1993-quando ali
trabalhamos a frentes daqueles programas.
Com vista a melhor introduzir o
que foi o trabalho da SECRETARIA DO MENOR, através da Diretoria da equipe
Técnica de Complementação Escolar ,passaremos a produzir um pequeno histórico
que melhor contextualizara o nosso trabalho, em seguida passaremos a discutir
as questões teóricas, e as especificidades práticas dentro do quadro teórico
.
CONTEXTUALIZANDO
COMO E PORQUE
Convivendo com a dimensão
geográfica de S.Paulo, e com a carência de equipamentos culturais na periferia
da cidade, aliado com a impossibilidade das famílias acompanharem seus filhos
em tempo integral, a Secretaria do Estado Do Menor-governo de S.Paulo , criada
em 1987, projetou um grupo de Programas que atendessem crianças e jovens-07 a
18 anos em regime de complementariedade ao tempo existente fora da
escola.Contudo mesmo crianças sem estar vinculada à rede Pública também participariam
desses programas, tendo como outro objetivo engajá-los na rede escolar.
Foi então criada uma diretoria
técnica com a incumbência de gerenciar quatro programas, então denominados de
COMPLEMENTAÇÃO ESCOLAR.
Os quatro programas:
.Enturmando-
circo escola- trabalhando com circo, teatro, artes plásticas , música e
dança.Localizados nas quatro regiões de S.Paulo em número de oito
equipamentos.Atendimento de 16.000 crianças e jovens.
.Casa Leide das Neves- Casa de cultura trabalhando com as mesmas
linguagens do anterior com exceção de circo.Localizadas em 2 regiões da cidade-
sul e leste. em número de duas casas.Atendimento de 300 crianças e jovens
Clube da Turma- além das linguagens do anterior agregava a área de esporte com destaque
para-nataçào, futebol, futebol de salão, vôlei, basquete, judô e capoeira.Em
número de cinco localizados nas regiões norte sul, e leste.Atendimento de 10.
000 crianças
Turma Faz Arte-programa cultural sem espaço físico construído, acontecendo em ruas
vielas, marquises, viadutos da cidade com atendimento das linguagens dos outros
programas, inclusive de esporte e circo.Em número de 14.Nas quatro regiões da
cidade. Atendimento de seis.ooo crianças e jovens
No que peses a denominação:
COMPLEMENTAÇÃO ESCOLAR. - ser ambígua e dar margens a decisões teóricas- da
defasagem cultural, a intenção prática era:
.oferecer projetos culturais para
infância e adolescência, incentivando a produção e a fruição da cultura.
.oferecer linguagens artísticas
diversificadas(Teatro-circo-artes plásticas - música -dança - vídeo e tv)
através de atividades em oficinas - que circulam meio artístico da cidade, mas
não transbordam para a periferia.
.buscar no viés
educação-lúdico-lazer ações de :
.operar com as diversidades de
saberes que se entremeiam nas atividades sócio-culturais e artísticas, como
forma de revitalização ao processo-educacional-instrucional;
.estimular as práticas esportivas
e recreativas como modo de socialização e de construção da estrutura grupal,
bem como do conhecimento do corpo e de práticas que implementem seu
desenvolvimento físico-motor;
.contatar com variedades de
linguagens artísticas que permitam a colocação do jovem e da criança na
sociedade como fruidor da cultura, constituindo um viés de ação da cidadania;
.referendar a produção da cultura
infanto-juvenil -incentivando a gestão e difusão cultural;
.buscar uma compreensão do outro,
do mundo, estimulando o jovem e acriança a projetos de vida;
.resgatar práticas
socializadoras, o trabalho em grupo, o conhecimento do outro, normas e padrões
de comportamento, enfim convivendo com o coletivo e ajudando a construir e
reconstruir um projeto social.
Ao instrumentalizarmos o menor
para a produção e fruição da cultura, estamos lhe propiciando também condições
de refletir criticamente os conteúdos da mesma cultura.
Buscamos um trabalho junto a
Cultura Popular, valorizando seus produtores, da região, bairro, ou da cidade
em geral, dando acesso às raízes históricas da cultura brasileira.
Introduziu-se por pertinência o artesanato com um leitura reflexiva acerca de
algumas produções estereotipadas naquele âmbito.
Entendemos que possibilitar a
fruição da cultura e a animação para a produção da cultura infanto-juvenil é
instrumental de criação da identidade social, de desalienação, de rompimento
com o confinamento cultural.
Com que enfoque divisamos o
trabalho com arte:
O trabalho na área de arte
deflagra um processo educador , de sensibilização, o que fertiliza o campo da
aprendizagem, através da estimulação de novos signos comunicacionais.
Trabalhar com a arte é trabalhar
com o campo da expressão, com possibilidades de mais ver, compreender e dizer o
mundo.É extrapolar do conceitual para o sensível, emocional.
Neste caminho buscou-se trazer o
artista-educador, produtor de arte contemporâneo, de modo a cruzar sua
experiência com a proposta educacional, propondo ao educando modos de experimentação
de novas técnicas e abordagens artísticas que compõem o universo da arte.
Privilegiou-se além do fazer
artístico, sua difusão em exposições, apresentações cênicas, shows-cricenses,
de dança, de esporte, com isso conclamando a comunidade adulta a partilhar da fruição
cultural e da compreensão do trabalho com os jovens e crianças.Com isto além de
propormos uma educação, mais ampla ao adulto, conseguiríamos uma parceria de
entendimento e incentivo ao projeto.
PARA QUEM
O PERFIL DAS CRIANÇAS E JOVENS
ATENDIDOS
Os programas de complementação escolar esteve constituída por crianças e jovens de faixa etária entre 07 e 18 anos.
O perfil sócio-econômico da
clientela alvo foi constituída por um patamar de baixa renda, entre 0 a 2
salários mínimos,sediada nos grandes bolsões de pobreza, seja em situação da
periferia da cidade, seja como sub-habitaçòes em cortiços ou outros tipos
cristalizadas nas áreas centrais e “de alta renda” da cidade.
O contingente familiar, por
fatores ,sobretudo de ordem econômica, se conduz num processo de desestruturação
familiar, tendendo a desorganizar-se para situações marginais, levando crianças
e jovens à situação de rua.
Os programas de Complementação
Escolar tiveram caráter preventivo(para situação de rua ) e inovador ao
reverter à política assistencialista, implementando um outro tipo de política
pública que se assegura pela educação informal, educação permanente, e de
0produção e difusão cultural.
PORQUE ARTE E O JOGO NA EDUCAÇÃO.
Nossa preocupação teórica,neste tópico, busca
esclarecer algumas questões no que diz respeito ao ensino da arte, os
preconceitos que existem quanto ao não reconhecimento da arte enquanto
conhecimento, bem como, para que serve a arte, que papel tem a mesma no
desenvolvimento infanto-juvenil?
Ao abordarmos a arte na perspectiva infanto-juvenil,
isto nos leva a pensar no lúdico , ou no jogo. Até porque tais manifestações se
encontram profundamente entrelaçadas.
Friedrich Schiller já no séc XVIII anunciava a
presença do lúdico na vida do homem, e ao mesmo tempo o condicionava a postura
estética.Na sua obra- A Educação Estética do Homem -ele propugna pela
existência de um impulso natural humano de origem no sensível que é o jogo.Além
do caráter sensível, estético ,do jogo Shiller como ninguém consegui divisar
uma face poética do jogo:suprimir o tempo
no tempo.Conjuga-se no lúdico o impulso sensível e o formal, à medida que
isto simula o suprimir o tempo.
Schiller chega a erigir um paradigma do humano ao
afirmar que : o homem só é pleno quando
joga(Schiller:1990).
Assim preferimos tratar a arte infantil ou como
processo criador- na expressão- ou como jogo- comportamento também criador e
estético.
Note-se que, com o lúdico começam a aparecer às
primeiras produções criadoras da infância, o que muitas vezes - lúdico e
criação se interconectam.Por outro lado tanto um como o outro tem características
semelhantes.É ação, tem espontaneidade é prazeroso e se estrutura através da
forma.
Todavia, se tais manifestações se entrecortam as
mesmas suscitam indagações entre os educadores e adultos quanto a sua eficácia,
se é que assim poderíamos dizer.Daí advêm indagações do tipo:
.o jogo é bom para a criança?.
. a arte é boa para a criança.?
E dentro de um espírito utilitarista vem:
.Para que serve o jogo e a arte,o que a criança ganha
com isto?
.
A arte e o jogo ficam parecendo como algo de adorno,
e nada mais, como se quem o elabora estivesse sob os efeitos de um piloto
automático acionado e que desacionado não se memoriza, não se resgata, não se
processa na mente.
Ao mesmo tempo a arte passa a ser vista apenas como
algo a ser contemplado , fruído no outro- na obra do outro- sem admitir que não
vejo o outro senão pela minha experiência que realizo, colho e processo.
Julgamos também que se menospreza a capacidade
conceitual ou racional que se aplica na elaboração técnica das artes ou dos
jogos.
Mas, sem reduzir ao caráter do conceitual ou racional
em que se revestem os processos de produção da arte, poderíamos também indagar:
onde fica a estética, que também perpassa os discursos conceituais na educação.
Parece-nos que há um preconceito quanto às
considerações do estético, quando se sabe que todas as ações humanas estão
permeadas pela forma estética.
Ou seja, em outras áreas do conhecimento se releva o
valor da estética, como no ensino da língua, da geografia e outras tantas
ciências, porque então se perguntar do valor da arte.?
Parece-nos, no entanto, que não há uma falsa
compreensão do que seja o estético- em geral, pois admitir essa pergunta seria
o mesmo que se interrogar para que serve o conhecimento.
Ocorre que numa sociedade de extremado culto ao valor
utilitário e imediatista do saber, a educação estética fica desarticulada face
aos maiores interesse pelos conhecimento e criações que objetivem a produção
econômica.
Por outro lado não se destaca nas diversas
disciplinas escolares, o estético ali contido.Não se ressalta a estética
criadora da literatura, não se propugna por um ensino criador literário, não se
sublinha a estética do desenho geométrico, da expressão cênica, da apreciação
estética dos relevos geográficos, e assim vai.O estético na verdade parece
ficar locado apenas nas obras de arte, no seu conjunto histórico, o que fica
distante do aluno.
Talvez sejam estas indagações que levaram o nosso
sistema educacional a não considerar de forma equilibrada e séria dentro do currículo
escolar, a experiência em arte.
Ao mesmo tempo é necessário que se reconheça que a
educação por essência tem como preocupação a criação de novos saberes e assim
de novas estéticas.
Para reforçarmos este caráter da estética presente na
educação observemos esta referência que nos dar Walter Garcia ao pensar o
sentido da palavra educação:
“...No sentido primitivo, a
palavra educação tem suas origens nos verbos latinos educãre( alimentar, amamentar, criar), com significado de algo que
se dá a alguém, e educere, que
expressa a idéia de conduzir para fora, fazer sair, tirar de.Nesta acepção
educação representa um ato a desenvolver, de dentro para fora, algo que está no
indivíduo....O sentido educere sugere
a libertação de forças latentes e que dependem de estimulação para virem a
tona.
Estes dois sentidos tem marcado
as teorias e práticas pedagógicas de tal forma, que podemos afirmar, sem medo de
incorrer em imprecisões , que os conceitos de educação tradicional e de
educação nova estão fortemente impregnados desta ambigüidade smântica.Com efeito,
podemos observar que a educação tradicional tem entre seus componentes mais
importantes, o fato de que os grandes problemas estão voltados para o
professor, para o programa, para a disciplina, enfim, para algo que é exterior
ao educando...A educação nova se identifica , pois, mais diretamente com o
sentido de educere, uma vez que os
limites da ação educativa representam algo eminentemente pessoal e dependem das
possibilidades de cada um, conforme os estímulos adequados que
receba...”(Garcia:1975)
A dimensão dada por W. Garcia nos leva a entender que
a expressão artística reside na concepção de educere, sem que com isso não se encontre dentro de educare outros
parâmetros da educação estética , como aqueles valores já consagrados pela
história da arte e que assim estabelecidos passam a constituir algo já
externado e que poderá se consubstanciar em conteúdos de um educare. Além do que ,educar além de
comportar o formar e informar , também compreende criar.
A EDUCAÇÃO \ CULTURA E A CRIANÇA.
OU
MÍSERIA POÉTICA : A PRIVAÇÃO(miró)
Não há o que discutir que a idéia de infância foi uma
criação da idade moderna, no sentido de criar uma aura em torno dessa faixa
etária criando-se uma ideologia que confunde a natureza humana com algo de
eterno , puro ,feliz e ingênuo.
Calligaris em seu recente artigo - O reino Encantado
chega ao fim- nos remete a pensar nessa ideologia criada na Modernidade e que
ora se estrangula ao longo do trajeto histórico das Sociedades Industrializadas
ou em vias de industrialização.
“A criança é uma caricatura da felicidade impossível:
vestida de feliz, isenta das fadigas do sexo e do trabalho, idealmente
despreocupada...”(Calligaris:1994)
Indaga e esclarece o mesmo autor, se na verdade o
amor que inventamos na modernidade
permanece, ou não se trata de um mito criado que se esgarça nos meandros da
perversidade do capitalismo industrial , e que não deu conta de acompanhar o mesmo
mito da infância.
“a infância talvez tenha sido a mais duradoura das
utopias concebidas pela modernidade.Com tantos outros ideais imaginados nos
últimos 200 anos, o mundo maravilhoso das crianças também entra em crise na era
pós-industrial e pós-moderna...”
O processo de adultização cresceu nos últimos anos
como o contraponto ou negação do mito que criamos- da infância que se recobria
de uma aura de congelamento- não cresce-.
O desenvolvimento da mercadoria enquanto objeto de
desejo extremado na sociedade tecnológica aperfeiçoa estratégias para criar
novos consumidores e atinge a infância, contradizendo o mito da pureza, e da
incapacidade as delícias do consumo.
Invadida pelo consumo, parte da infância sacia seus
desejos de consumista e do outro lado uma outra infância não realiza.Nasce um
imaginário de vitimização, de exclusão- marginalização.
Lasch ao contemplar tal questão diz:
“A produção de mercadorias e o consumismo alteram as
percepções do eu como do mundo exterior ao eu; criam um mundo de espelhos, de
imagens insubstanciais, de ilusões cada vez mais indistinguíveis da realidade.
O efeito do especular faz do sujeito um objeto; ao mesmo tempo, transforma o
mundo dos objetos numa extensão ou projeção do eu. É enganoso caracterizar a
cultura do consumo como uma cultura dominada pelas coisas. O consumidor vive
rodeado não apenas por coisas como fantasias. Vive num mundo que não dispõe de
existência objetiva ou independente e que parece existir somente para
gratificar ou contrariar seus desejos...”(Lasch:1986)
A tecnologia industrial além de diversificar os
objetos de desejo,portanto produzindo a
fantasia, especializou-se numa indústria cultural que para a grande
maioria da população infantil solapou o universo do lúdico simples
-tosco- artesanal- e não deu em troca nada senão a produção de uma vtimização e
de marginalidade.
Até mesmo o s espaços lúdicos foram destruído lo
quintal a praça- os folguedos , e tudo gira em torno do novo objeto lúdico
industrial e que faz a manutenção do cultural.
Disto resulta um confinamento geral da infância,
tendência, aliás, oriunda também desde a modernidade , como bem aponta
H.Arendt, quando a sociedade a partir da idade média descamba para uma privatização da vida social, a medida
em que a burguesia ascende ao comércio, a produção de bens e ocupa o poder
hegemônico.Com isso assegura a autora que a sociedade passará a um híbrido no qual os interesses privados
ganham uma importância pública.(Arendt:1961)
Os grandes ajuntamentos empobrecidos a serviço da(mão
de obra) indústria, e sem o tempo para o exercício da tutela, indiretamente
substabelece a tutela dos menores ao estado, que desprovido de especialidade
entrega quando pode ao particular, ou ao desgastado serviço da Escola Pública.
Disto resulta como aponta Perotti:
“,Neste estrangulamento do político, de redução
crescente do espaço público e de sua transformação em espaço social privado,
governado por proprietários “que não buscam senão aumentar as próprias
fortunas” ocorrerão mudanças fundamentais nas formas de conceber e organizar a
infância.Como não poderia deixar de ser, a privatização das relações sociais
alcança a vida infantil, fazendo também que crianças e jovens se distanciem
cada vez mais do que resta de vida pública, à medida que a ordem burguesa
vai-se cosntituindo.Com a burguesia, pouco a pouco e à medida que a urbanização
evolui, a infância passa a viver confinada nos espaços propriamente privados-
os espaços domésticos- ou nesses híbridos ao mesmo tempo sociais e privados- os
espaços confinados especializados(creches, internatos, creches e
outros)”(Perroti:1990)
Estratificada a infância pelo confinamento do sócio-
econômico, a mesma é vítima mais uma vez de um novo confinamento - o cultural-.
A Escola pública segregará o menor de baixa renda do
contato de outros estamentos sociais- classe média e alta- havendo com isso uma
perda de circulação da cultura que não interage com outro grupo e cultura.
A Escola passa então pelo confinamento da cultura, e
com isso, com a perda das diversidades culturais.
Adorno ao tratar da educação via a mesma “como um lado subjetivo da
apropriação da cultura. Daí se
depreender que a educação implicaria também no conjunto de significados
elaborados pela experiência, com a mediação dos sentidos e da consciência.
Educação e cultura estavam perfeitamente implicadas. (Freitag:1989)
Por decorrência de uma Indústria cultural , pensa
Adorno, surge uma semi-educação produzida pela igual deformação praticada pela
mercadoria no âmbito do cultural.
Semi-educação, pois as mercadorias já não tem acesso
a uma grande maioria da população de baixa renda, a cultura-mercadoria não
circula, e com isso se produz uma alienação, decorrente :
.do encobrimento das verdadeiras relações de
produção, que mascaram o objeto cultural;
.da inacessibilidade à cultura, enquanto mercadoria
que já se constitui.
Assim ao se negar à infância o acesso à cultura e ao
contemporâneo, nega-se ao mesmo tempo o caráter das linguagens, da expressão, e,
sobretudo da cidadania.
INFÂNCIA \ DESENVOLVIMENTO \IMAGINÁRIO ARTE E
EXPRESSÃO
Passaremos,agora,a
refletir nas teorias do desenvolvimento infantil, as razões que justificam o
lugar e o valor da arte e do jogo da criança e do jovem , resgatando ao mesmo
tempo o lugar da estética- e da expressão no conhecimento.
O aparecimento das Epistemologias ligadas ao estudo
do desenvolvimento infantil , não só patrocinou o aparecimento de novas
pedagogias, e com isto um melhor reconhecimento do que seja a
infância.Decorrência também foi à ênfase do papel da expressão criadora
infantil.
.
Nas produções das Epistemologias Genéticas,em Piaget,
ou nos trabalhos de Vygotski tanto um como outro consideraram a produção
artística expressiva da criança.Piaget, menos,e Vygotsky muito mais, contudo
tanto para um,como para o outro a expressão teve um caráter fundamental para o
desenvolvimento da linguagem , para os sistemas de representação.
Piaget num artigo muito pequeno-A Educação Artística
e a Psicologia da Criança-in Revista de Pedagogia- n-XXI-1969, afirma a importância
da expressão infantil, o que não se constitui afirmação de “uma arte”, mas,
muito mais de tendência ao estético,e que ele chamará de “jogo”.
Isto porque o jogo reúne para se exteriorizar características
tais como- ação, intervenção no mundo sob a égide da forma. No mesmo artigo ,
além de atestar a presença da estética na representação infantil ele instiga a educação
,para a produção criadora expressiva.
“...A educação artística deve ser , antes de tudo, a
educação desta espontaneidade estética e dessa capacidade de criação das quais
a criança pequena já manifesta a presença...”(Piaget;1966)
Em seguida Piaget realça a relação do jogo com a
expressão estética e como a mesma é partícipe dentro da realidade objetiva.
“...As manifestações espontâneas disto que se pode
chamar arte infantil devem, pois, ser consideradas como tentativas sucessivas
de conciliação entre tendências próprias do jogo simbólico( o qual não se
constitui ainda arte em sentido estrito) e aquelas que caracterizam as formas
adaptadas da atividade ou se prefere, síntese entre a expressão do eu e a
submissão ao real.Quando nela se ativa o desenho de construção, de
representação teatral, etc., a criança buscará satisfazer simultaneamente suas
necessidades e adaptar-se aos objetos, tanto como aos outros sujeitos.Ela
continua, em um sentido, a expressar-se, mas também ensaia inserir aquilo que
pensa e sente em seu mundo de realidades objetivas e comunicáveis,que
constituem o universo material e social.”(Piaget:1966)
Portanto nenhuma esquema de linguagem se desenvolve
na sua plenitude senão também pela expressão criadora.Expressar não apenas
compartilha do desenvolvimento, como permite a reflexão crítica das linguagens.
A Expressão criadora não pode ser vista apenas como
um desenvolvimento estético , portanto como uma supra-especialização do saber
da criança , mas muito mais como forma do conhecimento .
O saber também é regulado por uma forma, por uma
estética.Nesta via de raciocínio , as experimentações, repetições em jogos de
palavras, e imagens desenhadas repetidamente nas crianças , refletem esta
degustação da forma- do estético - presentes em novidades representativas
simbólicas.
Ali a criança brinca de simbolizar repetindo palavra
,imagens sons, experimentando-as às vezes transformando-as, para produzir um
resgate de significado.
A criação expressiva permite uma combinatória que
reescreve e inova a linguagem , e neste sentido ela é a possibilidade maior
criadora, desestabelecendo o antigo e inaugurando o novo.
O jogo tem neste momento seu papel de mediador, como
estrutura que ao experimentar goza, incita ao prazer.
Passemos agora a considerar a imaginação que se constitui elemento da expressão e da arte-e
também do jogo infantil.
No que diz respeito a este temário diferem Piaget e Vygotsky.
Para o primeiro, o jogo existe desde a fase
sensório-motora, mesmo sem haver a presença da representação.
Já para Vygotsky o jogo é essencialmente imaginação,
e só o cabe considerá-lo enquanto tal, dentro dos esquemas das representações,
portanto com a capacidade sígnica - em nível do simbólico.
Enquanto Piaget admire três espécies de Jogo, no
entender de Vygotsky há, e apenas há, um,jogo, que é produzido pela imaginação
e, portanto pela representação.
Ao analisarmos esta questão ,em outro trabalho nosso-
Uma Abordagem Piagetiana do Jogo- verificamos que na verdade, no que pese
Piaget considerar estrategicamente três fases do Jogo- jogo por excelência
-para ele é o simbólico, é este que ,segundo ele, instaura os sistemas de
representações, graças ao aparecimento do sistema amplo semiótico através do
símbolo.
Neste caminho de entendimento tanto Piaget quanto
Vygotsky admitem a função do signo como mediadores da expressão, e nem se
discute quanto à linguagem e a inteligência.A função semiótica , ou o signo são
os estruturadores do homem, desde a sua consciência a sua imaginação-fantasia-.
A imaginação, pois perpassa do campo consciente ao
inconsciente, e , portanto , das linguagens discursivas as não discursivas -
caso da arte.
É a imaginação a fomentadora de combinatórias e
experimentações que em alguns momentos se afigurará como estranhas metáforas ou
surrealismos , mas que na convivência e na aceitação do social tenderá a se
transformar em produtos-símbolos- da produção humana.
.
“...imaginação e realidade estão também relacionadas,
na medida em que é possível criar uma obra, um objeto ou um instrumento, que
não corresponde a nenhum objeto real. Assim a experiência- ampliada pela
imaginação- se materializa num produto.” (Krammer:1993)
Sonia Kramer ao considerar a arte no discurso de
Vygotski , estrutura acertadas reflexões quanto aos relacionamento da imaginação
- criação - arte e realidade.
A autora sugere alguns pontos a se considerar na
relação entre imaginação e realidade quais sejam:
.o produto cultural humano é produto da imaginação;
.a imaginação tem como faculdade combinar o novo e o
antigo;
.a imaginação amplia a experiência do homem para além
do circunstancial imediato;
.a imaginação se apoia na experiência, e esta, por
sua vez, e reciprocamente na fantasia;
.imaginação e realidade se inter-relacionam.
Das características apontadas pela autora, podemos
então perceber que mesmo aquilo que é produzido pela imaginação humana, como no
caso- a arte-, não deixa de ser uma relação combinatória, pois não existe um
novo sem um existente que se combina, incorporando algo que o faz transcender .Assim
o produto da criação ao se fazer conhecido integra-se à realidade, e é a
realidade do processo criador.
Nesse sentido o conhecimento estético produz o
objeto, e ao mesmo tempo ele é enredado pelo processo histórico tornando-se
assim objeto do conhecimento humano.
A imaginação, portanto advinda do subjetivo, mas
mesclada pelas influências do social, retorna ao social em forma de produto da
criação, atestando realidade imaginária e objetividade social.
S. Krammer destaca a inter-relação realidade e
imaginação, e demonstra a sua forma de operar na objetividade do mundo à medida
que o homem a constrói levado pela dupla influência, ao mesmo tempo em que ele consubstancia
a realidade pela criação , o que extrapola o criador e o seu imaginário
subjetivo.
“...Imaginação e realidade estão sempre relacionadas,
na medida em que é possível criar uma obra, um objeto ou um instrumento, que
não corresponde a nenhum objeto real. Assim, a experiência- ampliada pela
imaginação- se materializa num produto.E essa obra criada extrapola o
autor.”(Kramer:190093)
A força da relação - realidade x imaginário- se dá em
função do processo semiótico que assim age, como verdadeiro catalisador desse
duplo. Assim o signo e os instrumentos( objetos) na obra de
Vygotsky constituem um dos conceitos fundamentais para a compreensão dos
sistemas de linguagem, da consciência e mesmo da imaginação.
Os signos e os instrumentos correspondem à forma como
o indivíduo se relaciona com a natureza e a transforma. Esse dado de transformação
e mudança é fundamental na obra de Vygotsky, pois denuncia o caráter histórico
dos fenômenos culturais.Dai aquele autor admitir que a imaginação não é isolável
em nível do subjetivo, particular , mas de um social, coletivo, que transita em
nível de subjetivos amalgamados pelo social.
Solange Jobim e Souza consegue decantar essa
articulação, trazendo bem claramente para o desenvolvimento da cultural infantil:
“...De acordo com Vygotsky, no desenvolvimento cultural da criança, toda
função aparece duas vezes; primeiro em nível social e, mais tarde, em nível
individual.Esse processo de internalização, que redizer, de transformação de um
processo interpessoal em um processo intrapessoal, implica a utilização de
signos, supõe uma evolução complexa em que ocorre uma série de transformações
qualitativas na consciência da criança.Dessa forma, estudar a constituição da
consciência na infância não se resume em analisar o mundo interno em si mesmo,
mas sim em resgatar o reflexo do mundo externo no mundo interno, ou seja, a
interação da criança com a realidade...(J.Souza:1994-:125:126)
A autora nos mostra como o individual é moldado pelo
social, e não como se refere Piaget ao falar da fala egocêntrica- que segundo
ele o esquema de desenvolvimento se postularia primeiro num pensamento
autístico não verbal à fala socializada e ao pensamento lógico.Já para Vygotsky
o “ ...curso do desenvolvimento do pensamento não vai do individual para o
socializado, mas do social para o individual...”, ou do interpessoal para o
intrapessoal.Piaget mais tarde chega a reconsiderar as críticas de Vygotsky.
Desta feita, o imaginário que se mescla com a
realidade e destacadamente quando este imaginário se incorpora à obra criadora e
se constitui como uma realidade cultural, portanto constituinte da objetividade
histórica.
No que diz respeito à questão do real e imaginário no
constructo sócio histórico é fundamental que se perceba que a ordem do real é
submetida pela ordem da representação do imaginário, ou como ainda se expressa
Angel Pino:
...Real e imaginário
opõem-se não em termos de verdade e
ilusão, como fazem o idealismo
e o realismo empiricista,
uma vez que o real
não se apresenta de forma direta e i-
mediata, mas sua
representação, a qual é uma formação
imaginária...”(Pino :1991)
Pino destaca ainda ao discutir - mediação semiótica
em Vygotsky - a questão”filosófica e psicológica , do acesso ao real”. Na
verdade está questão envolve o caráter da realidade, que se envolve numa teia ambígua,
pois temos realidade - como expressão do
real e realidade como exterioridade
do real.
Constitui-se fato a três ordens: -o simbólico o real
e o imaginário e que se entrelaçam.É, pois o real aquilo que se apresenta sob a
forma da produção semiótica- do símbolo, e que relata um imaginário.
Tomando apenas o termo imaginário nos esclarece Jurandir
Freire Costa:
“ o termo imaginário é a substantificação de uma
atividade psíquica, a imaginação. Imaginação por sua vez, é a derivação latina
da fantasia em grego.No pensamento grego, fundamentalmente em Aristóteles, a
questão da phantasia pertencia ao quadro da gnoseologia. Phantasia deriva do substantivo phaôs,
que significa brilhar, dar a luz,iluminar, especialmente referido aos corpos
celestes.(White,1985,p43).Desta última palavra deriva dois verbos:phainô(mostrar), com sua freqüente forma
intermediária phainomai(aparecer) e phantazô( tornar visível, aparecer,
mostrar-se a si mesmo), donde os nomes verbais phantasia e phantasma.Em
latim, imaginativo vem do verbo imaginari, que por sua vez deriva do
substantivo imago, contração de imitago.Imitago
vem do verbo imitari, cujo radical im é a mesma de similis, e que significa imitação, semelhança(manzedo,1978) apud
(Costa:1989)
Ora desta especulação etimológica percebe-se contida
em imaginar;
.mostrar
.aparecer, tornar visível
.imitar.
.fantasiar
Ora, como habitamos na aparência da linguagem , da
representação, a imaginação, pela sua combinatória, nos ajuda a CRIAR, portanto
a conhecer.”o homem conhece, só conhece verdadeiramente, ou seja, só conhece a
essência pela aparência”(Costa;1989)
A Aparência é aquilo que podemos resgatar pela
imaginação, representando pelas linguagens, e sobretudo da arte, cuja maior
objetivo é atingir a aparência do sensível.
Hume citado por Costa salienta ;
“O que nos é dado primeiramente é a aparência.Quando
combinada com a consciência é chamada percepção.Agora, toda aparência contém
uma multiplicidade, donde diferentes percepções ocorrem na mente separadamente
e singularmente.Uma combinação destas aparências é exigida de uma forma que ela
não podem ter nos sentidos.Deve então existir em nós uma faculdade ativa que
opera a síntese desta multiplicidade.A
esta faculdade eu dou o nome de imaginação.(Hume in Costa:1989)
Por fim Hume chega a mostrar a relação entre o
imaginário e o social ao assim se referir:
“nenhuma idéia pode existir na imaginação sem ter
sido causada por uma impressão prévia...”(Hume in Costa:1989)
Ora, poderei até deformar o percebido, do social, mas
sua fonte é ele e minha subjetividade filtrante.
A expressão criadora infantil nada mais é que a
atividade da imaginação sendo ao mesmo tempo reflexo da realidade , portanto de
um imaginário\ social que a cerca.Estimular a criação é prover o indivíduo de fontes
de linguagem “,de compreensão de si , e do social- impregnado de realidades
imaginadas e vividas que o cerca.É incentivar a releitura do mundo que se
partilha no imaginário social
A expressão criadora infantil também se constitui
como elemento que articula a percepção, o pensamento e permiti-lhe introduzir
nas poéticas ou escrituras diversificadas em que se estabelece o social, e o
contemporâneo.
A PRÁTICA E A TEORIA
Uma proposta de projetos ligadas à arte só vem
aparecer no Brasil, em nível de política pública educacional com a lei
5.692/71.
M.H.C.de T. Ferraz e M.F. de R.Fusari agrupam as mais relevantes interferências sociais e culturais que marcam o
ensino e a aprendizagem artísticos brasileiros, dentro do contexto histórico
brasileiro como assim se segue:
“a-.os comprometimentos do ensino artístico(desenho) visando a uma
preparação para o trabalho(operários), originando no séc XIX durante o Brasil
Imperial e presente no séc XX;
“b-os princípios do liberalismo( ênfase na liberdade e aptidões
individuais) e do positivismo( valorização do racionalismo e exatidão
científica), por um lado, e da experimentação psicológica, por outro,
influenciando na educação escolar em geral(escolas”tradicional”e “nova”) e
também na educação em arte, ao longo do séc XX”;
c-o caos e os conflitos. os tecnicismos e a de pendência cultural
delineados no ensino de arte após a implantação da Educação Artística nas
escolas brasileiras na década de 70( Lei de Diretrizes e bases 5692/71);
d- a retomada de movimentos de organização de educadores( principalmente
as associações de arte-educadores), desde o início dos anos 80:
e-a discussão e a luta para inclusão da
obrigatoriedade de Arte na escola e redação da Nova Lei de Diretrizes e bases
da educação Nacional, após a Cosntituição Brasileira de 1988:
f-a retomada das investigações e experiências pedagógicas no campo da
arte; sistematizações ao nível de pós-graduação;
g-as novas concepções estéticas e tendências da arte contemporânea
modificando os horizontes artísticos e conseqüentemente a docência em arte ;
h-os debates sobre conceitos e metodologias do ensino de arte,
realizados em caráter nacional e internacional, a partir dos anos 80...”
(Toledo-Ferraz:1993)
Tal síntese cronológica da arte dentro do ensino
brasileiro nos embasa para entendermos:
.
a- fragilidade do ensino da arte dentro do currículo
escolar;
.b- a pouca contemporaneidade que se veicula dentro
do ensino;
.
c- o questionamento do modus operandi da arte face a
outros níveis do conhecimento( interdisciplinariedade);
O projeto da Secretaria do Menor a partir de 1988
teve com intuito trazer para uma faixa sócio-econômica menos favorecida a
introdução do conhecimento da arte, cobrindo assim uma lacuna da Escola
Pública, e do próprio confinamento cultural, como já tivemos oportunidade de
abordar; além de implementar uma educação informal, partilhada pela produção
cultural e do lazer.Conjuga-se assim possibilidade do conhecimento e lazer.
Nos deteremos a contemplar mais o trabalho de artes
plásticas , contudo ,inevitavelmente nos associaremos a outras linguagens, até
porque a proposta assim as previam.
As oficinas de Artes Plásticas não se constituíram
inicialmente como as mais procurada pelas crianças.As de Circo e Teatro
continham mais crianças.
Os arte-educadora oficinas de artes plásticas-
provinham de formação em Licenciatura de E. Artísticas ,com o curso concluído,
ou em curso.A proposta pedagógica tendia a uma oficina aberta, de modo a
propiciar uma maior captação dos interesses das crianças, claro que atrelado a
um princípio de planejamento e avaliação.
Dentre os princípios que norteavam as oficinas de
arte plásticas tínhamos:
.estimular o desenvolvimento da expressão visual e
plástica da criança;
.resgatar as imagens produzidas por meio das técnicas
do bidimensional.-desenho-pintura-gravura-xilo- monotipia.
.resgatar a criação no plano tridimensional através
das construções, esculturas, performances.
.promover a compreensão e vivência do espaço visual e
plástico, atrelado as matizes cromáticas.
O processo de criação sempre foi observado como
diferenciado, por conta das variáveis- faixa etária, não convivência com
determinados materiais ou técnicas, enfim por conta das características das
individualidades, que cada um possui.
Na maior parte das vezes o desenvolvimento do
processo criador se dava naturalmente, outras vezes exigia, maior conhecimento
do grupo ou afinidades com o arte educador ou da técnica escolhida para
trabalhar.
AVALIANDO
O trabalho com o ensino da arte é um trabalho de
constante avaliação e discussão, pois além de haver problemas de ordem
técnica-do campo visual e plástico- estão presentes outra ordem de problemas,
como aqueles ligados às questões emocionais \ afetivas.
Tínhamos clareza que nossa função era de educador,
portanto o que poderíamos fazer nesta esfera de problemas era perceber como os
mesmos repercutiam na produção visual criadora e daí partir para a escuta e o
diálogo.
Entendíamos também que nossa função acima de qualquer
outra era de promover ações educativas e que destacadamente nos embrenhávamos
pela área da estética , sem que com isso outros tipos de comportamentos gerais,
mais distanciados fossem relegados por nós.Portanto a fala da criança , suas
histórias causos e casos(seu imaginário) haveriam de ter escuta a fim de
patrocinar a facilitação do contato com a mesma, e por conseqüência do papel de
professor -facilitador no desenvolvimento criador.
Nos era claro que criar era revelar intimidades e que
por isso muitas vezes esse momento exigia sozinhez e segurança para poder
dizê-lo.
As imagens e objetos criados, sempre refletidos com o
perfil da criança nos dava indícios de compreensão do afetivo-emocional da
mesma.
Os estereótipos ou os chamados -signos emblemáticos
revelavam os imaginários ali presentes, e no mais das vezes reforçados na fala
da própria criança.
O social se revelava pelos signos visuais presentes,
ora traçados sem maiores problemas ora violentamente descritos em formas de
intenso sublinhado, seja pela cor, ou pela dimensão e características das
formas.
As imagens muitas vezes nos parecia à fonte de uma
realização de um desejo , ou a forma sendo repetida intensamente ou aditivada
por grossas formas, que pareciam algo a querer ser compreendido.(a produção de
uma catarse)
Neste sentido a presença da violência presente na
periferia da cidade , local também dos equipamentos, se projetava de modo
intenso, seja pelo aparecimento de imagens ligadas morte ou signos de violência
tais como: cruzes, carros de polícia , helicópteros e cores fortes.
Os estereótipos das imagens televisivas eram também
presentes como que seguindo um ciclo ou sazonalidade como num calendário
televisivo.Dai adviam- xuxas, maras , angélicas, signos de publicidade
televisiva.
O imaginário social ali projetado nos levava a
perceber que muitas vezes o desenho ou as construções visuais eram uma grande
escritura do mundo de cada uma das crianças.A escritura imagética era um relato
personalizado do social.Ali eram pinçados fatos e comportamentos carregados de
significados que se esparramavam nas intimidades da forma da cor e, das
distorções que assim requeriam.Como da mesma forma o social que plasmava pelo
delicado, bonito suave se explicitavam ora em signos emblemáticos-estereótipos-
como flor- carros(bem delineados)- paisagens com equilíbrio de cor e distribuição
equilibrada no espaço.
O imaginário fantasioso solicitava o confronto de um
eu com um bicho, podendo ser o cachorro, o dinossauro, o monstro marinho, o
home da caverna, o he man etc...
Neste aspecto do fantasioso, a criança é
perfeitamente captadora de que- o fantasioso da televisão em existindo lá , lá
na televisão era uma realidade de imagem, e que ela o relocava para outra
realidade que era o seu desenho.Havia, pois um coerência em trabalhar com a
realidade\fantasia.
Ai era percebido de forma clara o JOGO ou o Brincar ,
dando suporte ao possível do fantasioso.O jogo permitia ajuntamentos entre
possíveis e impossíveis no campo do figurado. O jogo tornava possível a
critica, o aprisionar do herói da fantasia, ou torná-lo humano, ou mais e mais humano.
O jogo criador o é por articular novas formas jogando
com índices de formas existentes, ou resgatando frações de formas que se
aglutinam, se justapões ou derivam para novas formas.
Percebe-se então um desenvolvimento do processo
semiótico, em que se trabalha com ícones, índices e símbolos.Observa-se também
a o deslanchar de índices para a constituição de símbolos, ou mesmo a
dissecação dos símbolos nos seus índices ou iconicidades.
O jogo criador muitas vezes produz imagens do tipo
tarjas de quadrinhos como se ali residisse uma escritura, um relato que admite seqüência,
um enredo.Neste sentido muitas vezes a palavra participa da escritura como
modelo de sublinhar as significações postas ou como modo único de assim ser
possível dizer.A palavra concorre com a imagem como sendo a própria coisa a ser
representada ou tendo mais força ou significação.
Muitas vezes o processo criador não se preocupando
com o figurativo dá margem ao nascimento do puro movimento imagético e da coro
movimento- e do seu rastro e conseqüência apreensão destas incisões e jogo de
sentido descobre-se uma estética delineada que apreendida começa a estabelecer
estilos.
O conhecimento neste campo se estabelece pela gama de
significados apreendidos e não revelados senão pela própria escritura da
imagem\objeto.O conhecimento é a apreensão assimilada pela percepção e
experienciada pela ação.
Se a produção criadora principia pelo abstracionismo
presentes em garatujas e se predispõe a esquematismos futuros atingindo o
figurativa para uma volta ao não figurativo se dá à medida que se descobre à
poética da imagem, onde o significado se encontra naquilo mesmo que não se
revela senão daquela forma.É um momento de extrema confiabilidade, e, portanto
, de grandes construtos significativos imagéticos, em que a palavra tem seu
lugar mais já não diz como diz a imagem. A imagem tem confiabilidade e se
registra num imaginário rico de formas e cores. Aqui o que é figurativo poderá
ser abordado microcospicamente e se projetar num abstrato silencioso e significativo.
Ao observar crianças nesta fase de restruturação do
figurativo para o não figurativo percebe-se novos rearranjos que se ativam como
que estruturada por uma inteligência prática e sensível.Aqui o imaginário é
acionado por uma memória prática cravada por elementos quase que surdos, digamos
assim , pois não se revela por uma explicação do discurso verbal, era é
manifesta, observável e sentida.Percebe-se, pois que a uma introjeção de um
novo conhecer.
Tal tipo de conhecimento é comunicável a uma
inteligência como um todo, afinal os conhecimentos não são estanques, sendo
processo criador desencadeador, pois seu trajeto é uma ação especulativa
estruturante, produtora de significados e ressignificações, bem como prazeroso,
e que chega a superar entraves, o que constitui a inteligência.
Marta Kohl de Oliveira em seu artigo- O Verbal e Não
Verbal -observa que os estudos do pensamento humano sempre se debruçam ao campo
das linguagens verbais , no interior do qual se estrutura um discurso da
inteligência.Entretanto, observa a mesma autora que há “mecanismos de
funcionamento cognitivo que não são verbais”e que se constituem alternativas
para os mecanismos que estruturam o campo verbal e à linguagem. (Kohl:92\93)
Pelos argumentos expostos entendemos que o desenvolvimento global do indivíduo, no que pese a importância da linguagem verbal, é também compartilhada pelo mundo de significações produzidas pela expressão criadora, além do que a mesma permite estruturar sua subjetividade, e perceber a de outro, como que percebendo as poéticas da existência e do saber humano que não se revela apenas no encontro do que é dito pela palavra, afinal à palavra tem sua participação primordial no campo da inteligência conceitual , mas a inteligência como um todo não apenas se restringe a tal.
Da entendimento de tais fatos é necessário que
saibamos lutar para a construção do homem, através de projetos que ofereçam a
possibilidade plena do encontro do mesmo com seus pares e de sua cultura e do
seu tempo.Creio, assim ser este o alvo da ciência: e por assim haver o saber é
dever ajudar o homem a conhecer, e por assim ser , bem viver.
E ainda:
“‘...e assim quebrar os muros imaginários que isolam
os espaços especializados, resgatando a infância para a diversidade dos espaços
públicos.Trata-se de fazer dos espaços especializados espaços transitivos que
não só acolhem em seu interior múltiplas manifestações, mas que também lançam a
infância para fora do mundo especializado e fragmentado da instituição,
estimulando o contato direto e a apropriação de manifestações que ocorrem no
espaço social mais amplo.”(Perroti:1990)
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